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Aprendizagem e qualificação profissional e sua relação com a competitividade das organizações: Quais as nossas responsabilidades?

Aprendizagem e qualificação profissional e sua relação com a competitividade das organizações: Quais as nossas responsabilidades?

Por Fabiano Larentis integrante do OECON

 

 

Uma das explicações para o baixo crescimento do PIB brasileiro nos últimos anos se refere aos níveis nacionais de produtividade, um aspecto que denota a eficiência no uso dos recursos, pois envolve a relação entre o que é produzido e os meios necessários para tal. Um indicador de produtividade relevante é o PIB (Produto Interno Bruto) dividido pelo total de horas trabalhadas. Conforme os dados mais recentes do Portal Our World in Data, da Universidade de Cambridge (https://ourworldindata.org/search?q=productivity), em 2017 o PIB por hora de trabalho do Brasil, a partir do critério de paridade do poder de compra, foi de US$ 16,34. O país alcançou a posição 57 das 66 nações analisadas, ficando atrás de países latino-americanos como Uruguai (US$ 26,03), Chile (US$ 25,60), Argentina (US$ 21,75) e México (US$ 17,72).

Para fins de comparação, os Estados Unidos obtiveram um valor de US$ 65,51. Irlanda, o primeiro no ranking em 2017, alcançou um valor de US$ 99,13. Quando consideramos a variação do indicador desde 1980, o Brasil cresceu 147%, alcançando a posição 27 dentre os 66 países, sendo ultrapassado tanto por países desenvolvidos quanto em desenvolvimento.

No gráfico , para um conjunto de países selecionados, podemos constatar tais informações. Destaque especial à Coreia do Sul, que em 1980 apresentava uma produtividade de US$ 4,70, inferior ao indicador do Brasil, e em 2017 passou para US$ 34,06, um crescimento de 625%. O México, por outro lado, manteve-se no mesmo patamar no período.

Produtividade: PIB por horas trabalhadas de países selecionados* Fonte: Our World in Data (2021); PIB pela paridade do poder de compra *Consideraram-se os maiores PIBs mundiais, incluindo os de maior crescimento na produtividade no período, bem como as maiores economias latino-americanas.

Um dos fatores que explicam tais resultados, conforme os economistas, é o tratamento dado à educação, pela relação entre qualificação dos indivíduos e capacidade de gerar riquezas.

Também influencia a produtividade os investimentos em infraestrutura e tecnologia e o ambiente de negócios. Em relação a isso, é importante destacar que a educação não se restringe a questões de cunho formal, ou seja, o planejamento e execução de cursos e formações curriculares e de capacitação. Além disso, ela não é uma atribuição somente do Estado em seus diferentes níveis, mas envolve a sociedade como um todo, incluindo as organizações.

A 15ª edição da Pesquisa Panorama do Treinamento no Brasil, realizada pela Associação Brasileira de Treinamento e Desenvolvimento (ABTD) e Integração Escola de Negócios junto a empresas com 100 funcionários ou mais, indica que o investimento médio anual em treinamento e desenvolvimento (T&D) por colaborador em 2020 no país foi de R$ 997.

Tal investimento, que conforme a pesquisa representa anualmente em torno de 2,6% sobre a folha de pagamento das empresas pesquisadas e foi distribuído principalmente para as lideranças em todos os níveis (55%), inclui os gastos com treinamentos, programas de formação e cursos curriculares (ensino fundamental, médio, superior, pós-graduação e idiomas), as despesas com a equipe exclusiva para treinamento e desenvolvimento e as despesas de viagem de professores e de organização dos cursos. Para termos um parâmetro, em 2017 o investimento foi de R$ 788 e em 2019 de R$ 652. Tal mudança em comparação a 2020 se explica, conforme o coordenador da pesquisa, pela previsão das empresas de crescimento da economia, anterior à pandemia, após anos de retração. As empresas projetaram aumento de investimentos em T&D para sustentar seu crescimento, cujos valores foram revistos a partir da intensificação da Covid-19. Uma evidência disso é que, segundo a pesquisa, 68% das empresas reduziram seus investimentos em média 51% com tal situação. Mesmo com a variação de 2019 para 2020, é necessário alertar que o valor é menor na comparação com o investimento anual por colaborador nos Estados Unidos, que é de US$ 1.309. Por sua vez, quando consideramos as horas médias anuais de treinamento por colaborador, foram 19 horas no Brasil segundo a pesquisa (15 horas em 2019).Nos Estados Unidos, foram 36 horas (35 horas em 2019). Ou seja, nesses critérios as empresas norte-americanas investem quase 2 vezes mais. Em termos financeiros, destacados no parágrafo anterior, a diferença é 10 vezes maior, quando consideramos a conversão cambial, com o alerta de que há diferenças de preços nesse contexto entre os países.

Ao levarmos em conta os resultados do PIB por hora de trabalho, apresentados anteriormente, a diferença é de 4 vezes a favor dos norte-americanos. A pesquisa também indica o impacto da pandemia no uso da tecnologia. Em 2019, 29% das horas treinadas envolveram atividades online, incluindo professores ao vivo. Em 2020, o percentual passou para 44%. Como tendências futuras, 56% dos respondentes informam que ampliarão a oferta de cursos online, EAD ou híbridos, bem como pretendem implantar plataforma(s) para cursos online.

 

Tais resultados, principalmente quando consideramos as diferenças entre Brasil e Estados Unidos, a partir das relações entre PIB por hora de trabalho e horas investidas em treinamento por colaborador, denotam o claro impacto do papel da qualificação profissional na geração de riquezas e na competitividade. Além disso, especificamente para o Brasil e suas empresas, esclarecem as oportunidades que temos de crescimento atrelado ao desenvolvimento humano, especialmente quando articuladas com estratégias e investimentos em infraestrutura, tecnologia e ambiente de negócios.

Necessário ressaltar que os investimentos em educação, especialmente para as empresas com suas necessidades cada vez mais desafiadoras em gerar inovações, vão além dos aspectos formais de aprendizagem e do investimento em plataformas digitais. Com a tendência de intensificação do Lifelong Learning e do (eterno) aprendiz sendo o centro e foco do processo de desenvolvimento humano nas organizações, inclusive com empresas modificando a denominação “educação corporativa” para “aprendizagem corporativa” e incorporando a função de CLO (Chief Learning Officer), a qualificação e o desenvolvimento dos indivíduos necessitam de um ambiente onde a aprendizagem possa florescer e se multiplicar, tanto em termos pessoais quando coletivos.

Tal ambiente necessita, para tanto, além dos elementos formais, envolver mentorias, tutorias, rotação no trabalho, gamificação, espaços para diálogos e reflexão, condições para a criatividade e possibilidades de errar como forma de aprender, assim como trocas de experiências em rede, para dentro e para fora das organizações. Um bom exemplo disso é a Metodologia 70:20:10 – 70% no dia-a-dia da prática (experiência no trabalho), 20% na interação e na troca com os outros e 10% do tempo aprendendo de maneira formal.

É fundamental que os resultados relativos a esses ambientes e processos sejam acompanhados, tanto no curto quanto no longo prazo, desde que compreendendo a dinâmica do que significa aprender e reconhecendo que a tecnologia deve servir como meio, não como fim. Como bem afirma Sugata Mitra, “não é fazer a aprendizagem acontecer, é deixar que ela aconteça”. * Professor da Universidade de Caxias do Sul (UCS) e membro do Observatório da Economia (OECON), do CIC-BG